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25 de outubro de 2009

Em três novelas da Globo, protagonista é atriz negra

Em um de seus trabalhos na Globo, “Sinhá Moça” (2006), Ruth de Souza, 88, uma das primeiras atrizes negras a fazer TV no Brasil, reclamou: seu papel não tinha nome, era apenas “a velha”. Seu par, vivido pelo ator também negro Clementino Kelé, era o Pai Tobias. “Eu disse: ‘Será possível que a pobre dessa personagem não tenha nem nome?’. Aí botaram Mãe Maria. E falei: ‘É Mãe Maria, Pai João e o moleque de recados. Como sempre. E nós já estamos no século 21.”

Naquela trama, Ruth seguiu com o mesmo nome e, agora, três anos depois, vê “alguma mudança”. De quatro novelas da Globo, três têm negras como protagonistas: Taís Araújo, em “Viver a Vida”, Camila Pitanga, em “Cama de Gato”, e Élida Muniz, em “Malhação”.

“Está na moda. Estão acreditando que podemos fazer. Até então, éramos vistos como Pai João, Mãe Maria e o moleque de recados”, diz a atriz, que protagonizou “A Cabana do Pai Tomás” (1969). Nela, Sérgio Cardoso, como diz a Globo, “precisou pintar rosto e corpo de preto, usar perucas e inserir rolhas no nariz” para viver um negro.

Na versão “moderna” (e oposta) da caracterização, Taís Araújo, 30, usou peruca para ter o cabelo perfeitamente liso em “A Favorita” (2008). Já em “Viver a Vida”, assumiu o cabelo crespo. “Pela primeira vez, temos uma Xuxa negra”, avalia Joel Zito Araújo, autor do livro e do filme “Negação do Brasil”.

Divulgação
Taís Araújo e Camila Pitanga, as protagonistas das novelas “Viver a Vida” e “Cama de Gato”

“Taís é Xuxa no sentido icônico, de um modelo carismático de beleza”, diz. Ruth de Souza concorda: “É a volta do ‘black is beautiful’”. Ou um “modismo”, como diz José Bonifácio de Oliveira Sobrinho.

Embora “a escalação não seja estratégia de marketing”, diz ele, “há um marketing em cima desse crescimento”. “Reconhecer que o negro é igual é importante e politicamente correto. É entrar na tendência.”
A inserção do negro, no entanto, não “rompe com a carga secular de estereótipos. Não podemos cair na visão ingênua de que, agora, as novelas vão defender o negro como modelo de pureza e beleza”, diz Joel.

Para o cineasta, o fato é ainda reflexo da estética da TV e do cinema dos EUA, que popularizou artistas negros como Will Smith, e de mudanças sociais: passou de 45% para 51% a porcentagem dos que se declaram pretos e pardos no Brasil (de 1998 para 2008). E cresceu de 8% para 15% a presença no grupo do 1% mais rico do país.

Sem cota

Por 20 dias, a Folha procurou Camila Pitanga e Taís Araújo para falar sobre o assunto, mas não foi atendida.

Em outra entrevista, Camila afirmou que o fato de ter três protagonistas negras no ar é “uma conquista histórica”.

Em comunicado, a Globo informou que “pela legislação, cabe somente à própria pessoa indicar sua origem racial”. Por isso, não diz quantos atores negros estão no ar.

Já a Record tem sete negros em duas novelas. Em “Poder Paralelo”, de 50 papéis, eles interpretam três. “Nas reuniões de escalação de elenco, sempre se alerta sobre a importância de escalar atores negros”, diz o autor Lauro Cesar Muniz.

Para o diretor da Central Globo de Comunicação, Luis Erlanger, o que se vê nas novelas agora é “coincidência”. “Na escalação, coincidiu que diretores e autores convocassem atores negros. Está coincidindo agora? Está. Pode não coincidir nas próximas [novelas]? Pode.”

Questão comercial

Formado no Bando de Teatro Olodum, grupo de atores negros, Lázaro Ramos, 30, diz que isso é “motivado também por questão comercial”. “Produtos com negros têm boas audiências.” Exemplo: “Cobras & Lagartos” (2006), com ele, Taís e Milton Gonçalves, teve, em média, 45 pontos no Ibope.

“Não gosto de levar esse debate para a questão social, da diversidade. Não é questão social, mas artística”, diz o ator.

Como Lázaro, Dani Ornellas foi do teatro e cinema à TV. Aos 31, contabiliza oito longas.

Na TV, porém, fez três novelas –duas como escrava e uma como iaô do candomblé. “Televisão é mais difícil. Não é o fato de estar como escravo ou empregado, mas da importância na trama. Não adianta ter negros à margem da história.”

Para Ruth e Lázaro, há outra questão: faltam autores negros. “Como o autor vai escrever um bom papel se ele só vê as negras na cozinha dele? Ou no samba com o bumbum rebolante?”, questiona Ruth. “A tendência da TV, com os mesmos autores, é que as histórias fiquem no mesmo universo”, diz Lázaro.

Os autores apontam para outro lado: até então, “existia uma grande carência de atores mais jovens”, afirma Silvio de Abreu, de “Belíssima” (2005). “O que muda não é a cor da pele, mas o interesse do autor. Ninguém vai arriscar escrever um papel importante se não tiver ator para interpretá-lo.”

Ele completa: “Antigamente, quando se pensava uma família negra, havia os pais (Zezé Motta, Milton Gonçalves, Antônio Pitanga) ou os avós (Ruth de Souza, Grande Othelo)”.

Já João Emanuel Carneiro, de “Cobras & Lagartos” e “Da Cor do Pecado” (2004), diz que “temos excelentes atores negros e é importante que eles não façam papéis de ‘negros’”.

Por AUDREY FURLANETO
da Folha de S.Paulo

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